9.30.2010








                  Há um empregado de mesa em cada um de vós  mesmo que sejam muito chiques 

Eu tive uma colega que se chamava samantha. este não é um nome falso. o nome dela era samantha e eu não consigo inventar outro nome para a samantha. tem que ser samantha. a samantha era uma menina que decidiu trabalhar no verão para ganhar alguns trocados para vestidos, cintos e caipirinhas no bbc. ela não precisava de trabalhar. era só uma menina rica e mimada a fazer frente aos papás.
a primeira vez que vimos a samantha foi na entrevista. ela estava sentada numa mesa com o gerente e nós andávamos em volta a limpar o restaurante. e à escuta. e foi logo aí que lhe tirámos a pinta: ela no seu sobretudo branco imaculado, baton vermelho e cabelo ruivo fazia mais perguntas ao gerente do que ele a ela. o momento foi tão hilariante que no final todos foram perguntar ao gerente se ele tinha conseguido o emprego. mas, apesar de tudo isto, ele contratou-a como a nova empregada de mesa. era gira e isso, muitas das vezes, bastava-lhe.
eu e os meus colegas já sabiamos como é que aquilo ia ser: nós eramos o gangue e ela era a betinha que não devia fazer parte da história. e foi com essa cara que a recebemos no seu primeiro turno. e, na primeira vez que fiquei frente a frente com a samantha, ela olhou-me de alto a baixo e disse-me: olha, gosto do teuuu...casaco. e depois comemos, vestimos os uniformes e preparamo-nos para a guerra. e depois o gerente: tu ficas na porta, vocês ficam nas mesas e tu ficas no bar. a samantha fica contigo para aprender. comigo? mas que mal é que fiz? e as minhas colegas riram-se de mim porque eu fiquei encalhada com a samantha. ao fim de 30 minutos num bar com 4 m2 eu já não podia vê-la à frente. e ela estava sempre minha à frente. eu, no lodo, não tinha a mínima vontade -ou tempo- de ensinar a betinha a tirar um café. e, no fim da noite, descabelada, transpirada e esfomeada olhei para a samantha: não tinha um fio de cabelo fora do sítio. vá samantha, agora vais-me ajudar a limpar isto. limpa os copos e o lavatório. 2 minutos depois diz ela com a cara mais enojada do mundo: desculpa...como é que queres que eu limpe isto?- isto era uma pia cheia de restos de menta dos mojitos, limas moídas das caipirinhas, palhinhas usadas e cascas de limão dos martinis. - como assim? limpas. atiras isso para o lixo e lavas. 2 minutos depois ela chega ao pé de mim e diz: desculpa...não percebi. queres que eu mexa naquilo? eu, no meu pior dia de tpm, cheguei à pia agarrei uma mão cheia do que para lá estava, apontei-a à cara da samantha e disse: fazes assim! pegas nisto, atiras para o lixo e depois lavasalguma dúvida? -não, mas...podes-me arranjar uma luva? eu não vou tocar...nisso.
no dia seguinte a samantha ficou na sala. de camisa, avental, leggings e botas de salto alto. para lá e para cá. o barulho das botas da samantha enlouquecia-nos a pouco e pouco. ploc ploc ploc. o gerente recebeu tantos olhares de "oh lhe dizes que amanhã tem que vir de ténis ou eu passo-me da cabeça" dos meus colegas que no fim do turno foi falar com ela. não teria sido preciso: no final da noite o calo que ela tinha no pé tinha chegado para ela entender. os dias foram passando e a samantha foi resistindo aos meus dias de mau humor, aos gritos dos meus colegas, aos raspanetes do gerente. e ao fim de 3 semanas já tinhamos, finalmente, criado um monstro. a perfeita samantha, aquela miúda que parava de levantar pratos de 2 em 2 minutos para retocar o gloss, era agora uma empregada de mesa: descabelada, suada, vermelha, de avental sujo, sem luvas e a dar o litro. e limpava as casas-de-banho como ninguém. e era a melhor a despachar os clientes.
mas, ao fim de mais uma semana, a samantha decidiu ir-se embora. foi um mês de trabalho que lhe deu um ordenado que lhe chegou para o que queria. e também me chegou a mim um mês para perceber que, se dermos uma oportunidade às pessoas, elas às vezes revelam-se melhores do que alguma vez imaginámos.
quando a samantha foi buscar o salário já era aquela menina betinha de novo. de casaco vermelho, pérolas e sabrinas. mas quando eu me despedi dela e ela sorriu eu vi muito além do que ela mostrava. e antes de sair porta fora ela ainda olhou para mim de alto a baixo e disse: olha, gosto do teu...avental.
encontrei  há dias este artigo aqui achei bem interessante :)

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